Dos carreteiros mais bem sucedidos surgiram as famílias dos grandes fazendeiros. Dizia-se na época que com um rapaz com uma carreta com quatro juntas de boi estava pronto para casar.
Através das carretas os produtores rurais transportavam a safra de arroz, de pequenas roças (cercados), e realizavam viagens. Conta Izoé Ferreto 87 moradora do Distrito de Azevedo Sodré que nos idos anos de 1940 vários moradores do distrito realizavam viagens para comercializar produtos do campo e aquisição de produtos como tecidos e outros em cidades vizinhas como Santa Maria a 180km de São Gabriel. “Eram grandes viagens, algumas famílias até viajavam nas carretas, demoravam meses. Era o momento de compra e venda de quem morava no interior. Quando colhíamos arroz em nossa lavoura, cerca de 80 hectares, os funcionários cortavam de foice e depois era colocado na carreta para ser levado ao galpão para que fosse descascado. Também se carregava nas velhas carretas, milho, abóboras e outros, especialmente quando o cercado (pequena lavoura) ficava longe da casa”, conta.
São Gabriel resiste as mudanças e torna-se Reduto dos Carreteiros
Com o advento do automóvel, a carreta passou a ser usada para transporte somente do interior para a cidade sede, isto é, do distrito para a cidade.
São Gabriel é um dos últimos municípios do Estado do Rio Grande do Sul, onde ainda vive um núcleo de carreteiros, que usufruem deste tipo de transporte para levar os produtos de suas lavouras para ser comercializado na cidade.
Estes pequenos produtores tem suas propriedades nas localidades de Pau Fincado, Vista Alegre, Lagoões e Santo Antônio, que foram os primeiros sesmeiros que povoaram essas localidades. Em sua maioria mantém a carreta por tradição, pois a função vem de várias gerações.
Dentro da valorização da classe carreteira, hoje existe no Museu do Parque Ibirapuera em São Paulo uma carreta doada pelo município, como forma de retratar uma forma histórica de transporte.
Tema vira Reportagem Internacional
Reportagem na Revista Ícaro no mês de julho de 1997 trouxe de manchete a reportagem “Os Últimos Carreteiros” com texto de Carlos Moraes. No trabalho destaca a reportagem que há séculos eles transportam e comercializam na cidade, o que produzem nos seus minifúndios, batata, laranja, melancia, moranga, charque e galinhas. Da localidade onde produzem e moram levam de 3 a 4 dias para percorrer uma média de 45 à 70 km. Essas dezenas de homens, há 20 anos chegavam a 70, e inclusive formaram uma associação. Hoje, no entanto, segundo informações do técnico da Emater Celci Blini que os acompanha, existem 30 que vivem da atividade. Segundo ele devem permanecer ainda por muitas gerações, pois os jovens estão dando continuidade a tradição das carreteadas.
Bem menores que as carretas antigas, as de hoje com duas rodas ainda mantém o estilo pampeano. “Um dia o toldo, que hoje é geralmente de zinco, já foi de couro ou quinchado de santa fé. Acontece que os carreteiros foram procurando maneiras mais práticas de cobrirem suas carretas, e o zinco é um material resistente e rápido para colocar, por isso as carretas, sem perder sua característica básica, são cobertas com ele”, argumenta Izoé Ferreto, que adquire constantemente produtos dos carreteiros.
Os bois que conduzem as carretas são conduzidos pelo nome, geralmente nomes ligados à tradição como Cambai, Pitanga, Pintado, Baio etc...Também acompanha o carreteiro a aguilhada ou picana, um tipo de vara comprida com ponta de ferro. Em alguns casos usa-se de uma taquara, onde na ponta coloca-se um prego para estimular o movimento dom boi.
A Administração Municipal construiu dois Abrigos para os Carreteiros, um no Distrito de Tiaraju, há 12km da sede do município e outro em Catuçaba, há 15km do primeiro, este último localizado há 15km das localidades de Vista Alegre, Santo Antônio e Lagoões, o último reduto dos Carreteiros e inaugurado em 1999. Com capacidade de acolher 10 carreteiros, com campo (capim) e água para alimentar e descansar seus bois, os Abrigos foram construídos em local estratégico, das localidades à sede do município os carreteiros levam dois dias, então os abrigos facilitam dois posos e descanso para os bois. Os abrigos medem 5 x 5m.
O APOIO A ATIVIDADE E A TRADIÇÃO - A partir de 1997 a Administração Municipal passou a desenvolver uma política de apoio aos carreteiros para facilitar a comercialização. Após a entrega dos abrigos, passaram a ser realizadas as “Feiras do Carreteiro”.
Nas feiras a Administração apóia com infra-estrutura e divulgação, chamando a população para adquirir os produtos destes. Em todas as edições, os produtos foram comercializados na sua totalidade, agilizando resultados na atividade e mantendo a tradição. Nos minifúndios, a prefeitura desenvolve programas de apoio como a Patrulha Agrícola, que vai da aração ao plantio, participando em duas etapas significativas, o apoio à produção e a comercialização.
Na cidade o carreteiro vira mascate e percorre as ruas para vender batata, laranja, galinhas e charque, vazia só de volta.
Aspectos Sociais - Reportagem no Jornal Zero Hora, do dia 02 de junho de 2003 relata um aspecto importante sobre os carreteiros gabrielenses e o motivo principal que, depois de estudos, levou a Administração Municipal a apóia-los. Diz a reportagem com texto de Moisés Mendes: “A Minissérie “Casa das Sete Mulheres” da Rede Globo, que trouxe a TV aspectos da Revolução Farroupilha, mobilizou oito especialistas em extinção no Estado. Eram carreteiras de São Gabriel no comando de 24 juntas, as duplas de animais. Na liderança do grupo estava Carlos Adão, herdeiro dos legendários Langendorf, os alemães que foram parar na zona de campanha do Estado, no século 19, e preservaram ali uma atividade típica dos pêlos duros descendentes de portugueses”.
E continua o jornal: “Mas o gemido das rodas de madeira que abria caminhos e afugentava fantasmas é barulho cada vez mais raro nas estradas de chão das localidades de Vista Alegre, Lagoões e Santo Antônio, quase limite com Santa Maria. Langendorf e alguns vizinhos resistem e ganham ânimo em cada participação em filme e novela”.
A reportagem ressalta o aspecto social da questão “Carreteiros”, o mesmo Langendorf ao relembrar a saga do avô Gregório e do pai João, reforça a idéia de que ser carreteiro é seu ramo e que não mantém a carreta por tradição, sim por necessidade, pois para ele tradição é para quem não precisa trabalhar.
Segundo especialista de fato a Carreta, também é mantida pelas últimas dezenas de carreteiros por tradição e necessidade, além de hoje ser uma atração turística de São Gabriel.
O historiador Osório Santana Figueiredo afirma que o amor ancestral pela vida na estrada justifica a passagem de pai para filho, motivo pela qual a atividade das carreteadas foi perpetuada pelas famílias Langendorf, Teixeira e Ramos.
É importante salientar que em determinada época eles receberam a proposta de trocar as carreteadas por um caminhão adquirido pela Prefeitura para fazer a entrega do produto na cidade, que foi recusada.
Na avaliação de especialistas a recusa tem a ver também com aspectos culturais a exemplo da tradição das viagens, dos causos perto do fogo de chão e das rodas de chimarrão prevaleceram. Para o Técnico da Emater Celci Blini que assiste os carreteiros, as carretas garantem independência econômica aos pequenos produtores e amenizam o Êxodo rural.
Conceitos e suas origens de fato
No começo da povoação do Rio Grande do Sul foram criados, por necessidade estratégica, os portos fluviais de Pelotas e Rio Pardo. Aos portos chegavam os carreteiros para buscar as cargas e leva-las aos pontos mais distantes da região. E de cidades, vilas e povoados partiam os carreteiros com os produtos da terra.
O Carreteiro - Os primeiros carreteiros do hoje Rio Grande do Sul foram os soldados do exército português, os contrabandistas, os comerciantes chamados “vivandeiros” e os estancieiros que adentravam a campanha. As carretas surgiram no Rio Grande do Sul por quatro pontos: reduções Missioneiras, com os Jesuítas, Rio Grande, com o Brigadeiro José da Silva Paes, Rio Pardo, com o exército de Gomes Freire, e Santo Antônio da Patrulha, ponto de ligação entre Laguna e Viamão.
A Carga - Carreteiros de Caçapava do Sul desciam as serras com cargas de cal, carvão vegetal, laranjas e outras frutas, rumo a Bagé, Santa Maria e outras cidades.
Para Palmeira das Missões, Tupaciretã e Nonoai os carreteiros levavam couros e pele e buscavam erva-mate para Santiago do Boqueirão, uma das cidades gaúchas que se formou com a passagem dos carreteiros, assim como Carazinho, nascida num campo cortado pela estrada geral das carretas.
Composição da Carreta
Aguilhada, Picana ou Guiada - É uma taquara com o comprimento proporcional ao número de juntas de bois, com ferrão na ponta para cutucar os animais e mantê-los ativos e parelhos na fieira.
Conjunto de Tração - Formado por peças de madeira ou ferro e acessórios indispensáveis para unir os bois e puxar a carreta: canga, canzil, brocha, ajoujo, tamoeiro, tiradeira ou cambão, passadeira ou fuzil, corda do coice e tapa-canga.
Tolda - É o conjunto de armação da tolda propriamente dita. A armação é um gradil construído com quatro ou cinco arcos de varas roliças de madeira, que dão forma a tolda, curvilínea ou de cumeeira. A tolda propriamente dita é a cobertura que reveste a armação, e nas primeiras carretas era de couro, depois de palha, junco, capim santa -fé e hoje de zinco.
Rodado - Duas rodas, que variam de tamanho, unidas por um eixo, de madeira ou ferro. Constituem o rodado, ainda as partes chamadas maça, buzina, raios, cambotas, roldanas e mata-bois.
Mesa - Compreende o leito, ou seja, o estrado no qual se deposita carga a transportar. A mesa é composta das partes denominadas chedas, cabeçalho, chavelha, focinheira, muchachos, cadeias, fueiros, assoalho, salva-vida e empulgueira.
Junta - É uma parelha de bois unidos pelo jugo(nas carretas mais antigas) ou pela canga.
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